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À Conversa Com... Maria Ferreira




Maria, seja bem-vinda à nossa rubrica À Conversa Com…

Nesta rubrica promovemos entrevistas inéditas com autores nacionais, e cujo propósito

primordial é fazer com que as suas palavras alcancem novos leitores.


1. Para começarmos, eis a pergunta mais importante, como é que nasceu o gosto pela escrita?


O gosto pela escrita nasceu acalentado, lá muito atrás no tempo, na infância, ouvindo o

som da palavra, da musicalidade das canções de embalar que os meus pais me

cantavam, das perlengas que me ensinavam. Mais tarde, as simples e pequenas histórias

contadas. Depois, as histórias contadas nos livros ilustrados que proporcionavam

perguntas sobre dúvidas e os costumados” porquês” das crianças, abriam portas para o

mundo do Sonho e da Imaginação e também o contacto com as chamadas de atenção

para o perigo. Comecei a apreciar conversas de adultos.

Desde cedo tive acesso a livros e boas revistas que existiam lá em casa. Vi os meus

pais, com muita frequência, lendo e o próprio trabalho do meu pai , do meu avô e tios

paternos estava ligado aos livros.

Aos doze anos de idade tinha lido quase todos os livros de Júlio Dinis. Aos quinze

anos, li O Bem e o Mal de Camilo Castelo Branco. O gosto da leitura e pela pintura, bem

como por várias Artes cresceu. Li muito e grandes obras desde a adolescência.

Por esta altura, escrevinhei, tentei registar em folhas soltas, que guardei durante muito

tempo, sentimentos, emoções, impressões e observações, mas sem pensar em escrever

um livro. Aquelas folhas eram somente para mim, eram conversas comigo mesma.


Posso dizer que há apenas aproximadamente dez anos, me lancei a medo na escrita. Mas

porque não escrever um livro sobre tanta coisa que pairava na minha cabeça, que me

preocupava e que podia ser útil aos outros?

Porque guardar para mim o que ia aprendendo e refletindo?


2. Como surgiu o ímpeto de escrever Talvez…Uma Caixa de Memórias e de o

partilhar com o público?


Não sou saudosista. Não penso como algumas pessoas que no passado é que era bom.

Houve coisas boas e coisas más, como agora há.

A palavra Talvez indica dúvida e eu sou um ser cheio de dúvidas e de incertezas. A certa

altura do livro, a personagem principal, que muito tem a ver comigo, afirma que não saber

quem é e diz que “talvez seja uma caixa de memórias” porque tem uma boa memória e

todos nós somos as nossas memórias e ainda carregamos as memórias dos nossos

antepassados. Nós somos memórias e quando perdemos as memórias não sabemos de

onde vimos nem para onde vamos. Quando se perde a memória mais vale morrer, não

somos, deixamos de existir, é como se fossemos uma planta, um vegetal.

É útil lembrar e refletir no passado, na História e nas histórias de família e de vizinhança

para que possamos tirar lições com os factos que aconteceram. Se tivermos presente o

passado estamos preparados para viver o presente e preparar o futuro.

Conhecer o diferente, através de viagens e da arte nos seus vários aspetos.


3. Como correu o processo de escrita desta obra. Partilhe connosco um pouco

sobre essa experiência?


Deixei correr o que me ia na alma, mas à medida que ia escrevendo, cada vez mais

sentia a necessidade de pesquisar, de relacionar épocas, regimes políticos, religiões,

culturas. Adoro pesquisar e escrever, contudo, confesso que escrever, tal como

pintar, não é fácil. Nem sempre “aquela” palavra certa aparece com facilidade. Por

vezes, é necessário pousar a escrita durante um tempo e retomá-la novamente. O

mesmo acontece quando pinto. Deixar o quadro, não o ver durante uns dias e,

depois, encontramos defeitos ou qualidades que precisam de ser trabalhados.

Vemos melhor se houver algum aparente repouso. ´Digo aparente, porque o

pensamento, esse tem de acompanhar a obra, tem de haver persistência.


4 . Talvez…Uma Caixa de Memórias fala-nos dos costumes, tradições, histórias

dentro da História e dos vários ambientes sociais desde os finais dos anos 50, do

século XX

De onde vem esta vontade compartilhar acontecimentos passados e ao mesmo

tempo preocupações com o mundo em que vivemos? Quais são os problemas

que enfrentamos nos dias de hoje?


Cheguei à conclusão que a Humanidade continua com os mesmos defeitos. Quem

diria, por exemplo, que as cenas trágicas que vi fotografadas nas revistas da Segunda

Guerra Mundial, quando era criança, (nasci sete anos após esta guerra) iam ter semelhanças

com o que se tem vivido na Europa, nos Balcãs e agora na Ucrânia? O que se passa por

esse mundo fora onde o Homem é o lobo do Homem ?

A tecnologia foi sempre uma grande preocupação da Humanidade. É bom que assim

seja, mas muitas vezes o Homem serve-se da técnica para dominar, para subjugar , para

conquistar o outro. A robótica mete-me medo. Chegará o tempo em que cada vez haverá

mais desemprego, mais fome, mais miséria ? Cada vez mais robôs substituirão o trabalho

do Homem. Quando faço estas perguntas lembro me da Roma da antiguidade que a certa

altura da sua História acabou com a classe média, apesar de haver homens livres. É que a

mão de obra escrava afastou o trabalho dos homens e mulheres livres que ficaram a viver

na miséria. Por isso, os imperadores para os distraírem politicamente, com medo que se

revoltassem, mandavam distribuir gratuitamente pão por essas famílias e bilhetes para o

circo. É a celebre frase romana “Pão e Circo”. Agora, enchem-se os telejornais com

futebol… e assim se vai distraindo o povo…

Preocupa-me o Futuro que vejo negro para os jovens e para os velhos.


Preocupa-me a corrupção, a solidão, a vida neste lindo planeta azul, a falta de ética.

Preocupa-me a angústia, a ansiedade, a depressão motivada tantas vezes pelo cansaço no

trabalho ou pela falta dele. Preocupa-me o interesse em acabar com a família, e com o fim

da propriedade privada promovidos ( disfarçadamente por um certo regime político que

tem caminhado com pés de veludo.

Preocupa-me a falta de diálogo nas famílias, o uso exagerado do telemóvel que não

permite o olhar o outro, o toque afetuoso. Preocupam-me os problemas da emigração e da

imigração.


5. Quais são os seus projetos para o futuro? Os leitores poderão contar com novas

obras e dentro do mesmo registo ou prepara algum desafio?


Já comecei outro livro, mas, por vezes, falta-me tempo e coragem. Veremos… nada

prometo.


6. Qual a mensagem que gostaria de partilhar com quem nos está a ler?


Gostaria que lessem este livro que escrevi, porque penso que levanta muitas questões de

relevo para a nossa sociedade. Acho que serve de ponto de partida para despertar o

interesse e o respeito por culturas diferentes.


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